A supervisão e a atividade seguradora num contexto excecional

Vivemos atualmente uma realidade nova, preocupante e rodeada de incertezas com consequências no futuro, imediato e mais distante, que ainda não somos capazes de inteiramente projetar. Esta crise sanitária, à escala global, provocada pelo surto pandémico Coronavírus – COVID-19, assumiu uma dimensão que não pode deixar ninguém indiferente e tem impactos na vida de todas as gerações a nível pessoal, social e profissional.

Esta situação obriga à assunção de uma responsabilidade coletiva, em que cada agente – social, económico e político – deve assumir o seu papel enquanto parte da solução, colaborando de forma ativa com ações e comportamentos que reduzam os riscos de contágio e promovam a coesão e a sustentabilidade social para, dessa forma, apoiarmos ativamente os sistemas de saúde e todos os profissionais que nos seus locais de trabalho, em casa e na rua trabalham para que nada falte e para que, dentro do possível, seja construída e mantida alguma “normalidade”.

Um dos agentes que assumirá o seu papel é o setor segurador nacional. Portugal conta com um setor segurador maduro, experiente e com provas dadas, que tem contribuído de forma significativa para responder às necessidades do País, potenciando níveis de confiança dos agentes económicos e dando garantias quanto ao desempenho das suas funções.

Sublinho a relevante função socioeconómica dos seguros, designadamente a função de mitigação e gestão dos riscos aos quais a vida humana e as atividades económicas estão expostas, a função redistributiva através da devolução à sociedade e à atividade económica de parte dos rendimentos captados e a função pedagógica e preventiva na promoção de boas práticas e bons comportamentos.

No atual contexto de adversidade em que estamos mergulhados, tenho total confiança que o setor segurador, os seus profissionais, operadores e reguladores não abdicarão de participar e responder afirmativamente às necessidades dos seus clientes e do mercado.

A Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) tem vindo a acompanhar de perto a evolução da situação excecional que se vive no e, em particular, o impacto que o agravamento da situação tem no setor segurador, promovendo as intervenções que se mostrarem necessárias para garantir que este setor se mantenha a funcionar em pleno, contribuindo dessa forma para dar resposta às necessidades das empresas e das famílias, para proteger os interesses dos consumidores e preservar a estabilidade financeira.

A diminuição da atividade económica afeta de forma direta a atividade do setor segurador, particularmente os ramos reais cuja produção vinha a crescer nos últimos anos, acompanhando o crescimento do PIB, crescimento que será inevitavelmente interrompido. Não é possível ainda determinar qual a dimensão e a duração da crise económica, mas não tenhamos dúvidas que o setor segurador será afetado.

A ASF mantém uma avaliação holística, em permanência, do impacto imediato dos efeitos associados à pandemia, designadamente nas vertentes da solvência, investimentos, liquidez, negócio e operacional.

A ASF tem na primeira linha das suas preocupações os consumidores. De um ponto de vista da supervisão comportamental, as recomendações enviadas às empresas de seguros reforçam o dever de, na sua atuação, terem em consideração que muitos dos seus clientes estão atualmente numa posição de grande vulnerabilidade, devido ao atual surto pandémico, pelo que deverão ser flexíveis no tratamento das situações que lhes forem apresentadas, procurando ir ao encontro das necessidades dos clientes, em temas como atrasos na cobrança de prémios, dificuldades de regularização de sinistros e de alterações de contratos e esclarecimento prévio de condições de resgate antecipado.

No atual contexto, a ASF tem ainda alertado as empresas de seguros para a necessidade de implementarem os seus planos de contingência, assegurando, nesta fase inicial, a continuidade do negócio, sem disrupções e tem transmitido orientações para que tomem as medidas necessárias com vista a restringir todas as ações no âmbito da política de gestão de capital que impliquem a descapitalização das empresas. As empresas de seguros têm à sua disposição um conjunto de mecanismos que podem ser usados para mitigar riscos, avaliados e monitorizados pela ASF.

Reconhecendo as dificuldades, a ASF definiu, também, medidas de flexibilização de regulação, designadamente em matéria de obrigações de reporte, de modo a que as empresas de seguros se foquem no essencial das suas operações.

A ASF – com 96% dos seus colaboradores em teletrabalho – mantém toda a capacidade de avaliação e supervisão, estando a cumprir as suas funções de regulação e supervisão graças ao esforço e à dedicação dos seus colaboradores que, nas difíceis circunstâncias, garantem uma supervisão ativa do setor segurador, em estreita cooperação com todos os seus operadores, e na defesa dos interesses de todos os tomadores de seguros e beneficiários.

Presidente da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões

 

Notícia publicada originalmente no Expresso.