Seguros que só cobrem metade dos riscos do crédito estão a aumentar
Sabe exactamente o que cobre o seguro de vida associado ao empréstimo da casa? Os mais baratos, pagando menos dez a 20 euros por mês, podem ser uma armadilha. E há novos seguros, como o que só cobre metade do capital em dívida.
Pedir um empréstimo à habitação e contratar um seguro de vida que pague a dívida em caso de morte, acidente ou doença grave é uma exigência dos bancos (apesar de não ser obrigatório por lei) e deixa os consumidores muito mais tranquilos em relação ao futuro. Mas as coberturas de risco deste tipo de seguros são muito variáveis, a que correspondem diferentes custos, e muitos portugueses contrataram ou continuam a contratar apenas a cobertura-base, a mais barata, muitas vezes a única apresentada pelo banco ou a única comercializada pela seguradora, sem perceberem a diferença face a outras garantias complementares ou reforçadas.
A terminologia da generalidade dos contratos de saúde é complexa, uma dificuldade que se agrava com o surgimento de novas modalidades de seguro, como a que apenas cobre 50% do capital em dívida quando o empréstimo é pedido por duas pessoas. De acordo com os dados recolhidos pelo PÚBLICO, a oferta desta última “versão” de coberturas está a aumentar, sendo oferecida por várias seguradores, e apresentada por alguns bancos, como é o caso do Bankinter. As características desta modalidade, mais barata do que a cobertura a 100% do capital para os dois titulares, nem sempre são devidamente explicadas aos consumidores, que só mais tarde se apercebem de que, em caso de morte, acidente ou doença de um dos titulares, o seguro paga metade do capital em dívida, ficando o outro com o encargo de pagar a parte restante.
Para além da especificidade de garantir o pagamento de 100% ou, mais recentemente, de 50% do capital no caso de morte, estes seguros podem ser divididos em dois tipos relativamente às coberturas de invalidez por acidente ou reforma: a mínima (no caso de morte ou invalidez absoluta e definitiva) ou a reforçada (no caso de morte ou invalidez definitiva para a profissão ou actividade compatível). O custos entre elas pode variar entre dez e 20 euros mensais, respectivamente, em boa parte das ofertas, como mostram os dados recolhidos para o PÚBLICO pelo ComparaJá.pt, um site especializado na comparação de produtos de crédito, a partir do exemplos de contratação deste produto.
Por várias razões, incluindo falta de informação, grande parte dos seguros contratados nos últimos anos inclui apenas a cobertura mais barata. Revelador desta situação, a plataforma adianta que, do total dos cerca de dez mil utilizadores registados no primeiro trimestre do corrente ano, apenas um em cada três procurou subscrever o seguro com cobertura mais abrangente ou complementar, aquando da contratação do crédito à habitação.
Para além diferença entre as coberturas dentro da mesma entidade, os dados do site mostram que os custos dos seguros contratados directamente nas seguradoras podem ser significativamente mais baratos do que os contratados junto do banco, que trabalham com apenas uma seguradora, do mesmo grupo ou com quem têm acordo. Ainda assim, e apesar de a lei estipular que as entidades financeiras não podem impor a sua oferta, na grande maioria dos casos é contratada juntamente com o crédito, a pretexto da oferta de bonificação da taxa de juro (na componente do spread ou margem comercial dos bancos) cuja redução, em muitos casos, não compensa o custo acrescido dos seguros.
Qual a principal cobertura dos seguros associados ao crédito?
As coberturas dos seguros de vida associados ao crédito têm muitas especificidades, variando em função das condições particulares fixadas entre as partes, tendo em conta montante dos empréstimos, idade e historial de saúde dos mutuários, entre outras. Mas todas garantem o pagamento do capital em dívida no caso de morte de um ou dos dois mutuários, embora aqui com uma lista grande de exclusões, nomeadamente quando esta resulte de acidentes em que o responsável se encontre sob o efeito do álcool (taxa de alcoolemia superior a 0,50g/l), consumo de estupefacientes ou conduta irresponsável, alguns casos de suicídio ou homicídio praticado pelo beneficiário do seguro. Nos casos em que o seguro cobre apenas 50% do capital dos mutuários, a morte de um deles garante o pagamento de apenas metade do valor em dívida, o que não acontece quando a cobertura é de 100% do capital em dívida para os dois titulares. Um aspecto importante é que esta cobertura tem prazo de validade. Ou seja, o seguro cessa a partir de determinada idade, fixada no contrato de seguro, mesmo que o empréstimo ainda não se encontre totalmente pago. Em muitos seguros, a caducidade acontece a partir dos 70 anos.
Em que consiste a cobertura-base de invalidez absoluta e definitiva?
Além da garantia de pagamento do capital em dívida no caso de morte, os seguros de vida têm outra cobertura obrigatória, a de invalidez absoluta e definitiva (IAD), e várias complementares, opcionais, como a de invalidez definitiva para a profissão ou actividade compatível (IDPAC), de doenças específi cas ou de desemprego. A IAD é mais barata e, genericamente, cobre situações de acidente ou doença de que resulte um nível de incapacidade muito elevada, na maioria dos contratos acima de 80% e, em simultâneo, que necessite do apoio de terceira pessoa para a realização de tarefas básicas (como vestir-se, alimentar-se ou outras). Esta cobertura tem prazo de validade. A data limite fica estabelecida no contrato, ocorrendo habitualmente acima dos 70 anos, por regra a data de extinção da cobertura de morte, que pode não coincidir com o prazo final do empréstimo.
Que vantagens estão associadas à cobertura de invalidez definitiva para a profissão ?
A cobertura de invalidez definitiva para a profissão ou actividade compatível (IDPAC) tem de ser expressamente contratada e encarece o custo ou prémio do seguro. Em caso de acidente ou doença, cobre um grau de incapacidade mais baixo, habitualmente entre 60% e 65%, mas também há casos em que pode ser mais baixa de 55%, ou bem mais elevada, a partir de 75%. Esta última torna esta cobertura menos interessante para os tomadores de seguro. Para além de outras condições específicas estabelecidas nos contratos de seguro, esta cobertura cessa acima dos 65 anos, coincidindo em muitas seguradoras com a idade legal de reforma. Na existência das duas coberturas de invalidez, a de IAD, mais limitada, passa a vigorar após a extinção da IDPAC, até à data-limite fixada na apólice.
A diferença de custo entre as duas coberturas é muito elevada?
Em alguns casos é reduzida, mas noutros já pode representar cerca de 20 euros por mês ou 240 euros por ano.
A partir de dois “casos reais” que utilizaram a plataforma ComparaJá.pt, é possível verificar que a diferença de custo (prémio mensal) entre as duas coberturas varia entre dez e 20 euros na maioria das duas coberturas propostas via banco (contratação simultânea do crédito e o seguro) ou nas propostas directas das seguradoras. A plataforma salvaguarda, no entanto, que os casos pretendem “apenas ilustrar a diferença de custos entre as coberturas, e não comparar os produtos e prémios dos bancos/seguradoras aleatoriamente seleccionadas para a análise”. De acordo com a informação enviada ao PÚBLICO, um dos casos envolve um seguro de vida associado a um empréstimo de 280 mil euros, a amortizar em 40 anos, e contratado por apenas um mutuário, um homem de 32 anos. As ofertas de quatro bancos e as simulações feitas junto de quatro seguradoras (neste último caso assumindo spread do empréstimo de 1%) mostram, por exemplo, que no caso das seguradoras Asisa e Logo a diferença entre IAD e IDPAC não chega aos seis euros, enquanto na Tranquilidade e na Caixa Geral de Depósitos ronda os dez euros. Acima de 20 euros estão as propostas da seguradora April (21,79 euros), do Bankinter (20,74 euros) e do Banco Santander, com a diferença mais expressiva de 29,66 euros. Neste universo, a percentagem de invalidez mais comum começa em 60% ou 65%, salvo no Bankinter, que começa em 55%, e no Santander, neste caso a mais alta, a partir dos 75%. O outro exemplo é o de um casal com 30 e 34 anos, e um empréstimo de 165 mil euros, a 40 anos, em que a diferença este entre as duas coberturas se mantém entre dez e 20 euros, ficando, no caso do Santander, em 24,4 euros. De referir que, nesta operação, a proposta de seguro apresentada pelo Bankinter é das mais baixas, mas só cobre 50% do capital em dívida por cada um dos mutuários.
Diferença entre os seguros propostos pelos bancos e pelas seguradoras é significativa?
Os dados recolhidos pelo ComparaJá.pt mostram que há “uma clara disparidade entre os prémios oferecidos pelas seguradoras face às dos bancos”. Em alguns casos, a diferença pode ascender a várias dezenas de euros. Boa parte dos bancos faz depender a bonificação da taxa de juro da contratação simultânea do seguro, mas em muitos casos, mesmo com um spread mais alto, a oferta directa das seguradoras compensa. A legislação estabelece que o banco não pode obrigar o cliente a ficar com o seu seguro, mas poucas instituições dão essa possibilidade aos clientes sem agravar as condições.
É possível alterar um seguro já contratado?
Sim, e é possível fazer várias alterações ao contrato de seguro, dentro da actual seguradora, ou de outra. Uma das alterações pode passar, no caso de ter apenas a cobertura-base de invalidez (IAD), por subscrever também a de IDPAC, com o respectivo ajustamento do prémio. A outra possibilidade passa pela substituição do seguro, contratado directamente junto de uma seguradora. Antes destas alterações, é aconselhável analisar o contrato do seu crédito, para avaliar se o banco pode ou não retirar a bonificação que possa ter dado à taxa de juro, o que fará subir o seu valor.
in Publico